Uma mulher que resiste, luta e acredita nos sonhos que moveram sua mãe… Por Adilza e Mauro Castro

Uma mulher que resiste, luta e acredita nos sonhos que moveram sua mãe e agora lhe dão forças na busca de um futuro digno para a comunidade onde mantém  suas raízes.

 O Jardim Miriam é uma periferia muito antiga. Soma, aproximadamente, 140.000 habitantes, constituindo o quinto bairro mais populoso da cidade. Essa imensa população possui parte significativa de seus moradores habitando em comunidades/ favelas, muitas,  quase tão antigas como o próprio bairro. Apesar de ser  um sessentão, e com múltiplas  carências, muitos foram os avanços obtidos na área de saúde, educação e saneamento, quase sempre, através de muita organização popular e determinação de lutadoras e lutadores: moradores que dedicaram e dedicam parte da suas vidas às causas populares. O Jardim Miriam concentra, neste sentido, muitas carências. Com  pouco mais de 13.000 pessoas empregadas em atividades formais, é retrato mais acabado da cidade de São Paulo e suas desigualdades.

As muitas necessidades do bairro emergem de formas mais dramáticas quando constatamos que a quantidade de pessoas empregadas na informalidade derruba a renda familiar média de maneira significativa.

O Jardim Miriam faz  parte da Zona Sul de São Paulo, encostada na cidade de Diadema e a pouco mais de 17 km do bairro de Moema, uma das regiões onde o poder aquisitivo da população que lá mora é altíssimo.

É nessa  comunidade que nasce, cresce e se torna mulher Adilza. Mulher negra, que transborda alegria, mas com muita fibra e tenacidade se soma a muitas mulheres lutadoras que foram e são determinantes para a melhoria da qualidade devida no território. Mulheres como a mãe de Adilza: a saudosa dona Carmen,  que deixou um legado de resistência e com quem Adilza aprendeu a lutar e defender a comunidade numa área que podemos considerar  privilegiada do bairro, entre as avenidas Brás de Abreu, avenida Cupecê e avenida Santo Afonso, porém com altíssimos indicadores de vulnerabilidade social. É nesse espaço, que alguns chamam de comunidade Brás de Abreu e outros também a denominam Nossa Senhora das Graças, concentrando, aproximadamente, 1.200 famílias que resistem às desigualdades, que a nossa guerreira busca  incansavelmente a conquista de direitos.

Mas, quem é Adilza, suas lembranças? Como lida com as carências da comunidade, as ações que poderiam ser implementadas pelo poder público? Enfim, sonhos de uma vida digna, mesmo com todo sofrimento imposto pela pandemia.

Segue, portanto, o depoimento dessa mulher lutadora que tanto orgulho e referência de vida nos apresenta.

“Meu nome é Adilza, tenho 46 anos, mãe solo, sem emprego formal, moradora da comunidade Brás de Abreu no Jardim Miriam. Filha de dona Carmem, que foi uma das grandes protagonistas da história do nosso bairro, militante engajada em diversos movimentos populares como, por exemplo, a luta por moradia, a luta por água, luz, creche, postos de saúde, entre outros. Minha mãe também esteve à frente das mulheres ligadas à igreja católica Nossa Senhora Aparecida que, naquele momento,  início da década de 1980, abriu espaço para os movimentos sociais onde começaram muitos projetos e também  formação, como: corte e costura, hortas comunitárias, padaria comunitária e, também, grupos pastorais  como Consciência Negra e Pastoral da Criança. Nas minhas  lembranças, a comunidade era um espaço de convivência e pertencimento. No projeto  hortas comunitárias, por exemplo, muitas famílias se reuniam para o cultivo e  almoços comunitários. Os mutirões eram organizados junto com festas comemorativas como o Dia da Criança, Festa Junina e também Natal Solidário. Nesse contexto, cresci vendo a participação da minha mãe e, a partir das suas experiências, fui sendo profundamente influenciada pela solidariedade que transbordava das ações coletivas. Cresci  nesse clima e também atuando nas ações desenvolvidas  pela comunidade da igreja.

Mais recentemente, contribuí intensamente com a construção do Parque para Pensar e Brincar. Ação de revitalização do espaço degradado no meio da comunidade que teve a atuação do Jardim Miriam Arte Clube (Jamac) e do coletivo de artistas Contrafilé.

Portanto, vendo todas essas lutas e batalhas sendo travadas desde cedo por minha mãe, tomei o gosto por causas sociais quando comecei, aos 17 anos, e seguimos durante muitos anos juntas. E como dizem: filha de peixe, peixinho é. Hoje me reconheço como liderança,  fui candidata a Conselho Tutelar em 2018 onde fui bem representada por minha comunidade.

São muitas barreiras a serem transpostas e a comunidade, apesar de antiga, enfrenta vários problemas: desemprego e muitas famílias carentes, falta de oportunidades para os jovens, falta de lazer e cultura para nossas crianças, falta de investimento por parte do poder público. Digo isso  com toda propriedade: o mesmo que diria qualquer morador, reconhecendo que não há  investimento algum. Com o impacto da pandemia, passamos por várias dificuldades. Muitas famílias, por não terem emprego, não tiveram acesso a itens básicos e nós, solidariamente, buscamos parceiros para assistir parte das famílias que estavam necessitadas.

Minha mãe foi e será sempre  minha grande inspiradora para toda vida, pois, nas lutas diárias, tudo que eu faço e sou, devo a esse grande exemplo de mãe, mulher guerreira, lutadora, patriota que jamais deixarei de seguir.

Tenho como sonho uma comunidade que interaja mais. Com mais estruturas, espaço de lazer e cultura para nossas crianças, cursos profissionalizantes para os nossos jovens e assim chegaremos à grande utopia de uma comunidade bem-sucedida.

A luta não para! Vamos para cima do progresso! Sempre!”

Para saber mais sobre Parque para Brincar e Pensar, clique em http://parqueparabrincarepensar.blogspot.com/?m=1

Imagem: Acervo pessoal

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Escrito por Expresso Periférico

One thought on “Adilza, fibra e resistência”

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