Nem mesmo a dor de perder os filhos a tirou das lutas

Mesmo com a dor da perda do filho e da filha, ela continuou lutando por direitos.

Mulher imigrante, família, pobreza, gravidez, estudar, condições de vida, alfabetização.

Moldada na luta, Maria Joana se constituiu como liderança popular com carisma e sensibilidade para acolher e acompanhar com dedicação os mais necessitados.

Prepare seu coração
Na história a ser contada
Uma criança pequenina
Da família foi apartada
Em busca de estudos
À cidade grande foi levada.

Maria Joana, conhecida como Dona Joana, possui uma história de vida muito parecida com a de muitas mulheres imigrantes que se deslocaram de seus estados de origem em busca de vida digna nas regiões mais desenvolvidas num momento da nossa história, entre as décadas de 1950 e 1980, em que São Paulo e Rio de Janeiro se destacavam como atrativos de trabalhadores e trabalhadoras em busca de melhores condições de vida.

Dona Joana nasceu em 1950 na cabeceira do rio Doce, Minas Gerais – um lugar muito pobre. Era filha de trabalhadores rurais, também muito pobres, que tiveram uma vida sofrida, na luta para garantir a sobrevivência de Joana e seus oito irmãos.

Apesar da pobreza, seus pais sabiam a diferença que a educação faria na vida dos filhos. Aos sete anos, ela foi enviada para o Rio de Janeiro onde, em companhia de uma tia, poderia desenvolver os estudos.

A tia era freira e atuava como responsável pela farmácia na Santa Casa que, à época, ficava localizada na rua Santa Luzia, Castelo, centro do Rio de Janeiro. Portanto, não podia acompanhar os estudos da sobrinha. E ela, então, foi para um colégio interno onde aprendeu de tudo: cozinhar, lavar, cuidar das pessoas em situação de rua – aprendizagem que foi complementada pela tia Vicentina, farmacêutica que cuidava das feridas dos moradores de rua, inclusive com as pomadas que ela mesmo fazia.

Diante das dificuldades
Logo começou trabalhar
Retornou a terra natal
Por não ter onde morar
Uma mulher lutadora
E uma filha pra cuidar.

Aos 15 anos, Joana foi trabalhar numa empresa que revisava fitas de filme da marca wonder brods e, aos 18 anos, engravidou da primeira filha.

Mãe solteira, numa época em que a sociedade era muito conservadora, teve que se render à realidade. A tia não tinha condições para dar o suporte necessário, obrigando mãe e filha a retornar para Materlândia, Minas Gerais.

Tendo necessidade de garantir a sobrevivência e com uma filha para criar, Joana deixou a criança com os pais e voltou para o Rio de Janeiro. Lá, muitas foram as dificuldades encontradas e resolveu tentar a vida em São Paulo.

O ano era 1970. Foi, também, muito difícil, mas, com muita luta e tenacidade, conseguiu melhorar de vida, sempre com muito trabalho.

Casou-se e veio morar na região do Jabaquara – Americanópolis/Vila Clara. Sempre muito católica, começou a frequentar a Igreja São José, onde conheceu o padre Inácio.

Com vivência coletiva
Dentro da comunidade
Conhecendo militantes
E muitas desigualdades
Sentindo a dor de mãe
De injustiça e crueldade.

Foi por meio das pastorais da igreja, numa época de efervescência das lutas por melhores condições de vida na periferia, que Joana conheceu José Teles que, na gestão da prefeita Luiza Erundina, assumiu a administração da Regional de Vila Mariana.

Outra pessoa que foi importante em sua trajetória foi Miguel Carvalho, militante político histórico da região que serviu como referência para participar do Partido dos Trabalhadores, inclusive em suas instâncias de decisão.

Em 1975 perdeu o filho Alexandre, assassinado aos 16 anos por conta de um tênis.
Situação que revela a fragilidade da vida nas regiões periféricas. Mesmo diante de uma tragédia pessoal, Joana continuou na grande empreitada pela vida!

Infelizmente, mais uma vez, o destino lhe prega uma peça. No ano de 2000, ela viu mais um filho ser assassinado – aos 19 anos por conta de uma namorada. O sofrimento é incalculável! Porém, Joana reuniu forças para continuar nas lutas, principalmente por creches, num momento em que havia um gigantesco déficit por equipamentos públicos para atender as crianças. Como empreendedora, Dona Joana, com sua tenacidade, criou duas creches. Infelizmente, na administração Kassab, as perdeu!

A luta tem moldado o caráter dessa mulher batalhadora que, mesmo diante de tantas adversidades aprendeu que é através do investimento em educação, nas lutas por escolas de alfabetização de jovens e adultos que podemos operar transformações duradouras na sociedade.

Buscando melhorias
Tendo muita resiliência
Lutando por educação
Onde há muita carência
A periferia agradece
A luta e a persistência.

Associação dos moradores de Americanópolis:

Em 1962, a Associação dos Moradores de Americanópolis foi constituída com objetivo de funcionar como escola para adultos tendo em vista que o Pérola Byngton estava em construção, bandeira de luta da Associação, e ainda com poucas escolas públicas para atender a crescente população do território.

A participação na Associação começou a partir do momento em que Dona Joana procurou o senhor Carvalho, fundador do equipamento, para montar um núcleo de alfabetização de jovens e adultos. Na oportunidade, foi convidada para ser vice-presidente sendo, depois, promovida a presidenta da entidade.

Liderar uma Associação implica ter muita disposição, coragem e perseverança. Sabemos que, infelizmente, há resistência por parte da população com ações coletivas, sobrecarregando quem assume a liderança e a luta por melhorias na comunidade. Dona Joana tem sido uma dessas lideranças que é, antes de tudo, resistência e comprometimento com a melhoria da qualidade de vida e uma sociedade participativa.

Obrigado dona Joana
Por esta contribuição
Um pouco da sua história
Organizando a população
lutando por direitos
E presidindo a associação.

Imagem: Acervo pessoal da entrevistada

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