A sobrevivência em meio a incertezas que a vida lhe apresenta é sempre um caminho difícil

Heloísa Helena dos Santos, tia Lu, é uma dessas mulheres: negra periférica que em toda sua vida tem resistido com determinação, garra e sabedoria para superar os solavancos que a vida apresenta.

Nascida em Belo Horizonte, quando criança por pouco não sofreu um abandono parental por conta de uma doença que a colocou às portas da morte. Heloísa resistiu!

Resgatada por uma tia, inicia sua longa caminhada em direção à vida. Passa a morar na cidade de Jequeri em Minas Gerais onde teve apoio e incentivo de uma professora, dona Ruth que foi determinante nos seus estudos iniciais.

Com 17 anos Heloísa vem para São Paulo conhecer os irmãos, ainda com os laços extremecidos em relação à família materna. Foi nesse período que Heloísa entrou em contato com a região de Cidade Ademar. Ainda jovem contraiu matrimônio, indo morar na cidade do Guarujá.

Infelizmente o companheiro faleceu com apenas 27 anos, deixando-a com uma filha ainda pequena.

Vida difícil! Praticamente sozinha teve meningite aos 23 anos e, mais uma vez, resiste pelejando para garantir a sobrevivência e manter a dignidade e a qualidade mínima de vida para a família.

Com a morte do pai sofre mais uma vez com o contato que teve com a mãe. É o momento do inventário onde, infelizmente, os interesses familiares e saúde delimitada a levam ao encontro da mãe que morava, nesse momento, em São Paulo.

Foi um período de turbulência, pois as feridas do passado não estavam completamente cicatrizadas. Portanto, aflora momentos de conflitos e a alternativa leva novamente Tia Lu para a resistência, seguindo sua própria trajetória.

Em uma nova união teve mais três filhos. Hoje separada, reconhece que os direitos básicos a ela sempre foram negados. Essa percepção foi um processo construído através de muito sofrimento que espelha, em grande parte, a vida de mulheres consumidas que são por uma estrutura social que inviabiliza e oprime a classe trabalhadora, sobretudo a mulher preta e periférica.

A evidência e o reconhecimento dessa situação se dá muito através do envolvimento na luta por moradia que acontece de maneira casual porém, determinante para um salto de consciência de tia Lu.

A participação na ocupação Vitória, local onde funcionava o antigo Motel Cleans, que durou de outubro de 2017 a julho de 2018, com 50 famílias, foi determinante na vida de Heloísa, pois possibilitou que ela ganhasse consciência. 

Muito mais do que a necessidade de ter moradia digna e garantir aos filhos uma condição mais favorável, foram amigos como Tuxinha, já falecido, que a convidou para a ocupação, Janaína, que emprestou um apoio fundamental. Clair, Dorinha e Osvaldir, coordenadores do movimento de moradia, foram ativos e determinantes no seu processo de tomada de consciência.

E foi no movimento, dentro da ocupação, que se tornou referência aqui no território. Tia Lu se constituiu como liderança por sua determinação e seriedade, acompanhada do filho, teve a oportunidade de adquirir conhecimento e maturidade política.

A ocupação durou quase 9 meses, quando sofreu a reintegração de posse, frustrando um dos momentos mais significativos da luta popular em nosso território. Contudo, o processo, reconhece Tia Lu, não foi em vão! Possibilitou um ganho de consciência e aprendizagem política de maneira intensa e duradoura.

Com o fim da ocupação e o início da pandemia, infelizmente as doenças voltaram. Todavia, Heloísa continua resistindo, agora com 62 anos mantém-se na ativa, acreditando na luta e, principalmente, no movimento de moradia que, segundo ela, foi uma verdadeira faculdade.

Esse breve relato revela a tenacidade de uma mulher que, apesar de todas as dificuldades impostas pela vida, é mãe, avó e continua sendo esteio da família, lutando e trabalhando para garantir o sustento e sobretudo, mostrando através de sua história de vida que o caminho é através da luta contínua e da resistência.

Imagens: Aguinaldo Pansa

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