A resistência das mulheres durante a ditadura civil militar. As mulheres nas lutas por direitos.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos foi instituída pela ONU – Organização das Nações Unidas – em 10 de dezembro de 1948. O mundo já estava repleto de grupos organizados lutando pela garantia de vida digna para todas as pessoas, mas a instituição desse documento potencializou as frentes de reivindicações por igualdade e garantia de direitos. 

Se para o Expresso Periférico esse é um tema de extrema relevância cotidianamente, no mês de março evidenciam-se dois pontos cruciais para a discussão de todos os coletivos que agem em defesa da democracia e de uma vida digna. Trata-se do Dia Internacional de Luta das Mulheres, lembrado no 8 de março, e da memória da Ditadura Civil Militar, que teve o seu estopim no dia 31 de março de 1964. 

Quando pensamos sobre a luta por igualdade de direitos travada pelas mulheres até os dias de hoje, entendemos que essa luta antecede em muitas décadas ao golpe de 64. Todavia, além de compreender a linha do tempo dessa luta, é importante e necessário traçar o paralelo entre os dois fatos históricos. 

O Dia Internacional da Mulher foi oficializado pela ONU em 1975. A versão mais divulgada sobre a escolha da data menciona que, em 8 de março de 1875, um grupo de cerca de 129 mulheres morreram carbonizadas em um incêndio intencional, provocado numa fábrica têxtil, em retaliação à greve de trabalhadoras. 

Essa narrativa, tão amplamente divulgada, fez parte de uma articulação histórica que objetivava apagar o conteúdo político da luta das mulheres que antecede e muito o ano de 1875 e vai além das reivindicações trabalhistas. 

A longa luta socialista das mulheres buscava a redução da jornada de trabalho e igualdade salarial e ainda apresentava pautas como a conquista do voto feminino, o enfrentamento do patriarcado e do sistema capitalista. Existem registros que comprovam que o mencionado incêndio data de 25 de março de 1911.

Sobre a intenção de inviabilizar a luta das mulheres por igualdade de direitos, é possível ver semelhanças com os tempos atuais?

A tentativa de apagar a participação das mulheres ocorria e segue ocorrendo de forma sutil ou escancarada, a depender de quem a promove. São muitos os exemplos da reprodução do machismo em nosso cotidiano: na literatura, na pesquisa, no meio político, no esporte ou na cultura ainda é comum ter apontamentos com maior divulgação onde o homem é produtor do conhecimento; ter a fala das mulheres interrompidas em plenárias e palanques antes mesmo de concluírem seus raciocínios; transferir as ideias de mulheres para outros que recebem os créditos em seus lugares; duvidar das reflexões e poder de decisão das mulheres.  

No Brasil, percebemos muitos avanços no protagonismo das mulheres. Entretanto, ainda nos incomoda a ameaça de perdermos algumas conquistas fundamentais recentes quando, por exemplo, temos fascistas como chefes de governo como foi o caso do presidente que antecedeu o atual. 

A banalização de situações de desigualdade amplia a discriminação e fomenta o racismo, o machismo e o classismo. As relações de violência entre as pessoas passam a ser ainda mais estimuladas e as ações de enfrentamento se minimizam. Caminha-se para a destruição da democracia e retirada de direitos.

O protagonismo das mulheres sempre esteve presente ao longo da história brasileira, conquistando espaço para suas narrativas e empenhando ações firmes no enfrentamento a violências diversas. E não foi diferente no período da ditadura civil militar de 1964. 

Elas se articulavam de formas diversas para enfrentar os papéis sociais impostos na época: clubes de mães, comunidades eclesiais de base, associações, sindicatos, partidos políticos, movimento estudantil. Bem organizadas, as mulheres lutavam por saúde, moradia, pavimentação de ruas, creches, custo de vida adequado e outras pautas urgentes. 

Foram elas que em 1978 iniciaram o movimento pela anistia que resultou na lei assinada em 28 de agosto de 1979 concedendo o perdão aos perseguidos políticos, fortalecendo o caminho para a redemocratização do Brasil.

“As rosas da resistência nascem no asfalto. Recebemos rosas, mas estaremos com o punho cerrado falando de nossa existência contra os mandos e desmandos que afetam nossas vidas.”

Marielle Franco

Saiba Mais

O documentário Memórias Femininas da Luta Contra a Ditadura Militar“, disponível no Youtube, é um projeto do Laboratório de Estudos do Tempo Presente (Instituto de História/UFRJ) que retrata a trajetória de mulheres que atuaram na resistência à ditadura militar brasileira. A partir de depoimentos do acervo “Marcas da memória: história oral da anistia no Brasil”, é possível ouvir os relatos marcantes de algumas vítimas de um dos mais graves atentados à democracia e a garantia de direitos que o Brasil já vivenciou e que, além de não poder ser esquecido jamais, deve ser combatido em todos os tempos.

Ainda na mesma plataforma, é possível encontrar o documentário O dia que durou 21 anos. Dirigido por Camilo Tavares, mostra os interesses e a participação ativa dos EUA durante todo o processo político que levou à deposição de João Goulart e à instalação da ditadura, tendo como importante destaque o grande acervo documental apresentado. É uma obra indispensável para compreender as relações de poder, conhecer a história e as semelhanças com o tempo presente.

DICA DE EXPOSIÇÃO

Mulheres em Luta! Arquivos de memória política – Memorial da Resistência São Paulo.

De 7 de outubro de 2023 a 28 de julho de 2024 – Classificação indicativa: 12 anos. Com curadoria de Ana Pato, a mostra tem como fio condutor o acervo de história oral do Memorial da Resistência que compõe o programa Coleta Regular de Testemunhos, com depoimentos de mulheres que vivenciaram a violência de Estado no período da Ditadura Civil-Militar (1964-1985) e na Democracia.

DICA DE LEITURA: O livro RESISTÊNCIA TEM VOZ DE MULHER, lançado em maio de 2023, reúne a voz da COLETIVA DE MULHERES EXPRESSO PERIFÉRICO em lembranças e enfrentamentos das dores de viver a adolescência e juventude em pleno período da ditadura.

Como as desigualdades afetam a educação no Brasil? – YouTube

“A saúde mental das pessoas negras está intrinsecamente ligada ao racismo” – Insper: Ensino Superior em Negócios, Direito, Engenharias e Ciência da Computação

Imagem: Arquivo Público do Estado de São Paulo – Fonte: Agência Senado

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Escrito por Coletiva de Mulheres

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