Política é conversa de mulher? 

Sim. Somos cidadãs, contribuintes, consumidoras, planejamos o futuro e enfrentamos o presente.

As últimas pesquisas apontam que as mulheres decidirão o próximo pleito eleitoral, em especial, as pobres e periféricas que tem renda de até dois salários mínimos.

Quanto vale o voto feminino? Mesmo correndo contra o tempo para influenciar as mulheres em suas escolhas, elas ainda estão muito aquém de protagonizarem as decisões sobre suas vidas. Nunca tivemos tantas mulheres vices de homens brancos e políticos profissionais passando pelos programas eleitorais de rádio e TV numa disputa por um sistema que as coloca fora do topo da pirâmide e, de forma sistêmica, continua diminuindo publicamente as potências, projetos e saberes do feminino. Envergonhar-se de estar neste papel hostil, violento e que degrada a condução da sociedade que se encontra adoecida e desumanizada, passa muito longe dos homens que lutam pela manutenção do poder masculino. 

Podemos afirmar que estamos representadas por estas mulheres que lutam para ocupar este poder branco, privilegiado, separatista, corrupto, desastroso para os humanos, cruel no que tange às oportunidades, à escuta e olhos das e para as excluídas e excluídos do mundo dos abastecidos com suas despensas que transbordam para muito além do real.

É cansativo, repetitivo e por vezes sem eco insistir em trazer essa pauta? É. Mas é do debate dessa pauta que as mulheres, verdadeiramente, serão protagonistas de mudança e retomada de valores enterrados junto com o preconceito e as desigualdades sociais.

Segundo dados da PNAD Contínua (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua), realizada em 2019, a população brasileira é composta por 48,2% de homens e 51,8% de mulheres, percentual este que deveria garantir, minimamente, representatividade nos parlamentos federal, estaduais e municipais.

Apesar do Brasil ter superado, nos últimos anos, as diferenças de gênero na educação, o que já coloca as mulheres como mais escolarizadas em relação aos homens e considerando que, elas, continuam estudando mais (presença nas graduações, pós-graduações, especializações, mestrados e doutorados) e trabalhando mais (são chefes de família e, quando não, são responsáveis pela participação paritária na composição do orçamento familiar), mas isso ainda não reflete no mercado de trabalho, na igualdade de oportunidades, na remuneração e principalmente na presença na vida pública.

Sim, a composição nas esferas de decisões da nossa sociedade (pública e privada) distanciam, restringem e invisibilizam as mulheres dos debates, ficando nas mãos dos homens discutir e elencar as pautas prioritárias para a condução de suas vidas.

Quantas mulheres e quantas homens você conhece que atuam na política institucional?

Faça uma lista e constatará que é absurdamente desigual. Quando insistimos que os parlamentos respeitem a paridade, 50% mulheres, 50% homens, é para que minimamente tenhamos participação, nos fazendo presente nestes lugares.

Você já votou em mulheres para vereadora, conselheiras públicas, deputada estadual, deputada federal, senadora?

Você já votou em mulheres para Prefeita, Governadora ou Presidente?

Estas respostas nos conduzem ao lugar que ocupamos no cenário da política, as grandes usuárias dos serviços de transporte público, saúde, educação, creches, equipamentos de lazer e que sofrem as consequências de uma economia em frangalhos e dos aumentos abusivos praticados em supermercados, feiras ou contas de luz, água, gás, vestuário, etc… e que não contam com uma política pública integrada que viabilize sua participação neste mundo de poder. 

Quando se dispõem e emprestam seus corpos para ocuparem os espaços que lhe são de direitos, são interrompidas, silenciadas, tocadas fisicamente (vide o caso da deputada Isa Penna, que foi vitima de violência em uma sessão da Assembleia Legislativa do estado de São Paulo, ocasião em que um colega de parlamento tocou seu corpo, tratando como um território livre e se apossando da sua intimidade) e tantas outras parlamentares que sofrem ameaças para além de suas pessoas, atingem suas famílias para amedrontar e sufocar a presença de mulheres na vida política. 

Essas e tantas outras situações de apropriação do corpo, da fala, do pensamento e das histórias construídas com sacrifício, ausências e muita dor, têm propósito e fim único de excluir as mulheres da política..

Todo esse processo trilha o caminho de amedrontar a mulher a ocupar um lugar de fala e de luta para todas, desestimulando e provocando cada vez mais o menor número de mulheres nos debates políticos, seja pela exaustão do cotidiano, pelas práticas machistas que não respeitam seu lugar, seja pelo silenciamento impregnado na vida pública. 

Como chefes e patrões, proprietários e possuidores, negociam, fazem acordos, decidem, editam regras, pintam uma cidade que serve apenas para atender seus desejos ideais de poder.

PRECISAMOS FALAR DE POLÍTICA!

Sim, política é tudo que orienta nosso cotidiano.

Sair de casa todos os dias para trabalhar, estudar, fazer compras, controlar os gastos, fazer os tais milagres para colocar comida na mesa e chegar até o final do mês, é política.

Perder seus direitos de cidadã, não ter emprego, casa para morar, assistência/serviços públicos que acolham suas necessidades, é política.

Receber um salário baixo ou diferente daquele pago a um homem que exerce a mesma função que a sua, ter uma jornada de trabalho ou uma sobrecarga de tarefas que lhe causam exaustão, é política.

Sofrer violência doméstica, ser ameaçada pelo seu companheiro, não ter proteção dos órgãos públicos que lhe garanta e preserve seus direitos de inviolabilidade do seu corpo, ter medo de andar na rua, é política.

Viver sem perspectiva/esperança de uma vida melhor, não ter acesso a educação de qualidade para si e para os seus, saúde integral que atenda as suas necessidades, direito a diversão/entretenimento e descanso, é política.

Frequentar teatro, sala de cinema, biblioteca, livrarias, passear nos parques com áreas verdes preservadas e ter uma cidade que foi pensada para te receber, é política.

Alimentar-se com produtos sem agrotóxicos, ter legumes e frutas na sua rotina alimentar, fazer pelo menos três refeições por dia, é política.

Ausência de políticas públicas para atender os mais de 30 mil moradores de rua na cidade de São Paulo e de cuidados com os nossos jovens usuários de drogas, extermínio da nossa juventude e assassinatos da população negra, racismo e todo tipo de preconceito, é política.

Preservação das nossas florestas, do ecossistema, dos rios, é politica.

POLÍTICA é coisa de mulher e vamos meter a colher nesse caldeirão.

PRECISAMOS FALAR DE POLÍTICA.

Você sabia que o Brasil, há mais de 20 anos, possui legislação que garante cotas eleitorais? Ou seja, as mulheres devem ocupar no mínimo 30% das candidaturas para as eleições proporcionais. Que os homens ocupam 85% das vagas do Congresso Nacional?

Que das 513 cadeiras de deputados federais, apenas 77 são ocupadas por mulheres (15%)?

Que apenas 12 mulheres foram eleitas para 81 vagas do Senado? Isso representa 14% de representação feminina (79 homens x 12 mulheres).

Que existe uma perseguição às mulheres, negras, periféricas, LGBTs, que ocupam cargos públicos, desconsiderando suas falas e seus projetos postos para debate e aprovação?

Que a nossa participação é fundamental e fortalece os processos de construção de uma cidade mais feminina com formulação de políticas públicas para mulheres?

Vamos enriquecer o debate, participar e discutir como queremos nossa rua, nosso bairro, nossa cidade, nosso país. Sabemos das nossas necessidades, queremos nossos filhos vivos e saudáveis, ser livres para fazer nossas escolhas, juntar todas as vozes e belezas num projeto de vida pautado nos princípios de justiça, oportunidade e igualdade.

Uma nação diversa, precisa encontrar no cenário da política sua representação feminina, negra, indígena, LGBT, periférica, artística.

O mundo só será um lugar bom para todes, quando as mulheres ocuparem os espaços de decisão, forem respeitadas em suas falas, construindo estratégias para além da mediocridade individualista. Que a coletividade seja a regra e que todas e todos caminhem partilhando sonhos e emprestando seus ombros para a necessidade do outro.

Que as diferenças não nos definam, mas sejam a possibilidade de, harmoniosamente, encontrarmos equilíbrio entre o humano e a natureza.

Imagem: Bertha Lutz e outras feministas no I Congresso Feminino, realizado no Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro em 1922 no Rio de Janeiro. Arquivo Nacional.

Compartilhe:

Escrito por Evinha Eugênia

Deixe um comentário