Contexto social, luta por emprego, educação e área social, periferia, conscientização e política.

Como milhares de brasileiras e brasileiros que travam as lutas muito cedo em busca de melhores condições de vida, devido ao fato de que no Brasil, na sua história, não houve um projeto social, cultural, econômico, de desenvolvimento e democrático que gerasse oportunidades iguais para todas as pessoas, mas apenas para uma pequena minoria privilegiada. Isso tem levado a classe trabalhadora à exclusão e sacrifícios, para ter direitos básicos, como moradia, educação, saúde, alimentação, emprego e outros direitos.


É dentro deste contexto social desfavorável que a nossa entrevistada Regilânia Moreira Montes, popularmente e carinhosamente conhecida como Lânia, vai construindo sua vida familiar, profissional, social e intelectual. Formada em pedagogia e há anos trabalhando como gerente do CCA Frei Tito, nos  conta um pouco da sua história, seu trabalho e suas idéias.

Professora desde a infância
        Enfrentou muitas dificuldades
        Os filhos vieram cedo
        Muita responsabilidade
        Lutadora incansável
        Coragem e vivacidade.

Sou nordestina e tenho muito orgulho disso, embora tenha nascido em São Paulo,  me criei no Ceará, onde, aos 13 anos de idade, já tinha terminado a oitava série, e sendo uma criança bastante ativa e líder de classe, fui convidada para dar aulas para a terceira série em escola da prefeitura. Sem carteira assinada, apenas um contrato, mas, como precisava trabalhar, acabei aceitando. Foi meu primeiro emprego, Fiquei nesse trabalho até os 17 anos, quando vim para São Paulo.

Chegando aqui, em 2001, comecei a luta para arrumar emprego e logo tive o primeiro filho, quando ainda estava na adolescência, aos 18 anos. Na luta para garantir a sobrevivência minha e do filho, passei por várias experiências laborais. Trabalhei em escolinhas particulares, creches, balconista, operadora de caixa de supermercado e outros ofícios. Atualmente, sou casada, meu filho mais velho está com 27 anos e o mais novo vai fazer 18.

A minha entrada para a área social nem foi uma opção, foi resultado da busca que estava fazendo profissionalmente. Teve início quando comecei trabalhar no CCA (Centro para Crianças e Adolescentes) Santa Amélia, junto à Ação Comunitária, e foi uma escola para mim, tanto na área de educação como na social, mesmo porque, naquele período, não havia a divisão organizativa destes serviços como temos hoje, tudo era meio misturado e não tinha vínculo com a prefeitura.

        Guerreira como Maria bonita
        Freiriana na educação
        Atuando na área social
        Atendendo a população
        Com crianças e adolescentes
        Melhorando a formação.

Passei por outros serviços semelhantes e fui adquirindo conhecimentos, mas foi só após ser contratada na ONG Afago (Associação de Apoio à Família e Comunidade), como educadora socioeducativa, no Bairro Pedreira, onde eu moro, que tive o primeiro emprego com carteira assinada e um salário mais compatível com minhas necessidades, pois, até então, o que recebia era ajuda de custo, vinda da assistência social e que, na verdade, era o que tinha para sobreviver.

Durante este processo todo, sempre procurei estudar e, quando me matriculei para fazer a faculdade de Pedagogia, que era um dos meus sonhos, nem tinha dinheiro para pagar, as amigas e amigos me ajudaram muito. Na época, por volta de 2005, recebi ajuda do projeto Gali, com a irmã Penha, que ajudava jovens da comunidade, e fui agraciada com este projeto e sou muito grata por isso. Após ter arrumado o emprego, consegui equilibrar os gastos entre estudos e criação do filho.

Há 10 anos trabalhando como gerente do CCA no Frei Tito, o objetivo de nosso trabalho  é empoderar as crianças, adolescentes e famílias. É desafiador, e ao mesmo tempo prazeroso também. Não tem monotonia, quando se pensa que se passou por tudo, outras questões vão surgindo e isso se tornou ainda mais acentuado com o advento da pandemia, quando  tivemos que adequar tudo. Mas é gratificante, quando vemos jovens que já passaram por aqui, que vêm agradecer por terem melhorado de vida, ou vêm só visitar, matar a saudade e observar o prédio que está diferente.

Sabemos que este trabalho e algumas assistências que são feitas para as famílias não resolvem os grandes problemas que elas enfrentam. Para isso, precisam ter emprego, renda para toda gente e políticas públicas para satisfazer as suas necessidades básicas, mas enquanto não tem isso, este trabalho ajuda a amenizar a situação e dar alguma alegria para estas pessoas. O Frei Tito, como este e outros trabalhos, adquiriu muita confiança junto à população local e instituições, isto está sendo demonstrado na pandemia, onde há solidariedade e muitas doações.

        Os desafios estão colocados
        Na desorganização social
        Conscientizar e organizar
        Numa sociedade desigual
        Combatendo as injustiças
        E o racismo estrutural.

Na questão da conscientização das famílias, muitas vezes temos dificuldades em trazer as pessoas para participar das reuniões, a não ser quando se trata das festividades, embora queiramos que elas participem das festas também. Todas as entidades que fazem este trabalho deveriam fazer o trabalho de conscientização, mas, até onde sei, só algumas o fazem. O Frei Tito desenvolve esse paciente trabalho, como este boletim que está sendo feito e indo para as ruas conversar com o povo.

No trabalho de identificação racial, não é nada fácil e exige paciência. Em atividades didáticas, fazendo uso de um auto retrato, onde é apresentada uma foto de uma pessoa negra e uma loira, as crianças, mesmo sendo negras, se identificam com a loira. Valorizar a ancestralidade é um processo de conscientização. Eu mesma demorei a descobrir que era negra e isso é perceptível, também, entre educadoras e educadores. As pessoas, ao fortalecerem o racismo, pensam que estão nos  tratando com carinho. Tipo: “estou mais com os pés na senzala do que você”. Declaração que recebi ao matricular o filho numa escola, quando disse que era negra.

Na periferia, tem gente indo ao suicídio devido à falta de recursos para a sobrevivência. Na minha opinião, umas das coisas a fazer, é no campo político, elegendo governos de esquerda que adotem medidas que dêem dignidade ao povo, nas suas necessidades básicas, como moradia, saúde e educação. Mas o mais importante mesmo, é fazer o trabalho de conscientização, sem isso fica difícil fazer mudanças. Embora com os limites que tenho, procuro fazer isso. Penso que a esquerda deveria se unir para fazer este trabalho, mesmo sabendo que é de formiguinha, mas cada vez que tento trazer mais uma pessoa para esse campo, já é um ganho. É preciso sonhar e levar esperança, mesmo sabendo que não é fácil, ainda mais com estes ditos cujos na presidência e em São Paulo.

        Antes desta entrevista
        Um ato de generosidade
        Distribui tickets às famílias
        Vindos de solidariedade
        Com brilho feliz nos olhos
        Divulgando as atividades.

No mais, peço para divulgarem as nossas atividade no Expresso Periférico. Uma delas são as inscrições para as crianças poderem fazer parte do atendimento do CCA. Inscrições estas que são feitas nas quartas-feiras das 9h às 11h e das 14h às 16h. Atende crianças de 6 a 14 anos e 11 meses. Atualmente, atendemos em torno de 130 crianças. No momento, não temos vagas disponíveis, mas, quem tiver interesse, precisa fazer a inscrição e aguardar.

Curtam nosso trabalho nas redes sociais:
Facebook: Frei Tito Cidade Ademar.
Instagram: @centrofreitito
Youtube: scfv cca Frei Tito.

Esta entrevista contou com o apoio e simpatia de Ana Lucia da Silva.

Imagem: Acervo da entrevistada.

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2 thoughts on “Paulistana e nordestina, nordestina e paulistana”

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