Lembranças e reflexões sobre gêneros e diversidades. Vivências e aprendizados.

Texto: Coletiva de Mulheres Expresso Periférico

Continuar criando este espaço significa, sem dúvida, habitá-lo de histórias, dessas que por andar procurando algumas coisas, nos encontramos com outras. Isso nos acontece ao escutar o pulsar de nosso bairro e as diferentes vozes que o formam. 

Hoje trazemos lembranças que batem no mesmo prego e que acordam perguntas ou talvez respostas. 

A primeira foi há poucos dias, quando escutávamos o relato de uma garota do bairro que nos compartilhava como foi seu começo profissional, experiência que relatava ainda experimentando no corpo a tristeza dessa época. Ela relatava que logo após se capacitar e ser contratada em uma barbearia, nenhum cliente queria seu serviço porque era mulher. Ainda mais, eles preferiam ficar na espera até que um homem estivesse desocupado para atender. Agora, passados um par de anos, e ainda muito nova, ela é reconhecida pelo seu trabalho “além” de seu gênero. A segunda lembrança está vinculada a um chá de bebê, onde foi revelado o “sexo” da criança que estava por nascer e logo ao saber que seria uma menina só se escutava que seria a princesinha do papai, que a mãe contaria com uma parceira para toda a vida e muitas outras expressões assim. 

Estas experiências são só uma mostra de tantas que cotidianamente transitamos e que nos levam a refletir como ainda é preciso desconstruir a noção imperante de gêneros. Permanecer com um modelo engessado de como se deve ser homem ou mulher é uma reprodução violenta de um sistema patriarcal [forma de organização social governada e regulada pelos homens. O termo é utilizado no feminismo para se referir à nossa sociedade atual, que ainda é dominada por homens e organizada para privilegiar homens] que nos impõe o que é correto, sadio, apto, aceitável.

Nossa coluna tem por nome: gêneros e diversidades, então é oportuno reconhecer a necessidade de abandonar as dicotomias, principalmente aquelas da categoria gêneros e sexualidades, compreendendo a riqueza que existe na diversidade. 

Não só pelos exemplos expostos aqui, mas pelas práticas do dia a dia, o bairro que habitamos ainda está atravessado pela lógica dicotômica de dois gêneros, homem e mulher, com uma lógica cisgenero [no campo dos estudos de gêneros, é um termo usado para descrever pessoas cuja identidade de gênero e sexo biológico coincidem] imposta para todes, sem olhar nossas singularidades e que demarca como deve ser o agir de cada um, dependendo seu gênero. Nomear esta realidade é o primeiro passo para começar, se assim o desejamos, a mudança. 

Pode nos  ajudar em nossa desconstrução, aproximarnos do conceito de Anthony Giddens, um sociólogo que expressa que os gêneros são uma construção social: “…diz respeito às diferenças psicológicas, sociais e culturais entre homens e mulheres. O gênero está ligado a noções socialmente construídas de masculinidade e feminilidade”. Também podemos nos adentrar no conceito que defende que o sexo também é socialmente construído, mas, para a coluna de hoje, acreditamos que é melhor deixar por aí.

Reconhecer que os gêneros são socialmente construídos possivelmente nos permita entender que tem uma finalidade, estarem construídos desse jeito e não de outro. Então, podemos perguntar:  Para  onde nos leva esta imposição de gêneros? Por que querem impor a divisão de gêneros em tudo (brinquedos, roupa, profissões, atividades domésticas…)?  De que modo podemos enfrentar coletivamente esta lógica cisheteronormativa? Lembrando que assim como se filtra nos nossos pequenos atos, também a mudança pode ser desde baixo, no pequeno, no simples, com a certeza de que gerar espaços para todes é de suma urgência, se desejamos um bairro com liberdade e amor.

Imagem: @chanliface. Reprodução/Instagram

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Escrito por Coletiva de Mulheres

One thought on “Onde se escondem os gêneros”

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