“Com minha raça e minha cor
Eu solto meu grito no ar
Muito sangue ainda escorre
Isso tudo precisa acabar
Você não vê porque tá dormindo
Não percebe que tá alienado
Eu tô de olho aberto
O quilombo não está no passado
Dandara dos Palmares
Luiza Mahin
Mariana, Crioula
Tereza de Benguela
Não sou rainha do lar
É melhor acordar
Movimento é de resistência
Viemos protestar
Meu corpo, meu território
Meu filho, minha cor
Movimento de uma batalha
Resistência, coragem, amor
O medo acabou
Vamos bater, batucar
Mulheres guerreiras unidas
Este mundo vamos dominar”

Ilu Obá de Mim (2022)

Neste mês, a coletiva de mulheres conversou com uma vizinha que faz parte do bloco Ilú Obá de Min, que neste ano saiu às ruas com um enredo que é um grito de resistência e celebração da vida daquela que se tornou símbolo de luta por justiça e igualdade: “Irúgbìn – Família Franco, Marielle”. Na força das mulheres do Ilú Obá de Min, este ano ecoa a voz destemida de Marielle, uma mulher que desafiou poderes opressores.

Vamos conhecer um pouquinho a história de Carol e como esta experiência de pertencer faz diferença na sua vida.

O Bloco Ilú Obá de Min, que significa Mãos Femininas Que Tocam Tambor Para o Rei Xangô, existe há 19 anos. Seu início se deu junto a outro bloco, onde era permitida a entrada de todos os públicos. Diante disso, surgiu a necessidade de separar e seguir apenas com mulheres. Assim, ao separar, quando aconteciam os ensaios, as próprias mulheres do bloco convidaram outras que passavam por perto, independente de raça e cor.

O Bloco já cortejou pelas ruas de São Paulo com cerca de 40 mulheres em sua bateria, onde foi aumentando ao longo dos anos. Hoje somos cerca de 400 mulheres na rua tocando, cantando e dançando.

Há poucos anos, surgiu também a necessidade de focar na entrada e permanência de mulheres negras e pretas, já que é um bloco afro. Agora todas passam por uma entrevista de heteroidentificação e assim é avaliada sua entrada ou não.

Entrei para o Bloco o ano passado, graças a Sandrinha, minha mestra, que conheci na aula de percussão da Coletiva União Deixa Ela Tocar. Já haviam me apresentado o bloco anos atrás, disseram que era minha cara e que eu precisava estar, mas não tinha o conhecimento e entendimento do que era, do que significava e muito menos maturidade para.

Escolhi entrar para o agogô, passei pela entrevista e fui selecionada. Eu não queria ter escolhido este naipe porque eu gostava do Djembe (tambor), pois já tinha tido contato com o mesmo e eu me identifiquei, o som grave me encantou. Infelizmente, o Djembe é um instrumento muito caro e naquele momento eu não tive condições de comprar um.

Dentro do bloco, existe o amadrinhamento, onde outras mulheres emprestam o instrumento para quem não tem, mas eu preferi esperar e conseguir comprar o meu. Depois de um tempo, eu entendi o propósito de estar no Agogô e agora não consigo me ver fora dele. Até tatuei em meu braço!

Criei muitos vínculos com as mulheres do naipe, que foram extremamente importantes para minha permanência e evolução. As mulheres dali têm uma importância em minha vida para além do bloco. Muitas são como mães, irmãs, amigas que posso confiar de olhos fechados, consigo me abrir com elas, me expressar em sentimentos, sorrir, rir, abraçar, cuidar, consigo ser literalmente eu! 

Ser uma mana preta, periférica, LGBT, gorda, me tornou seletiva em relação a lugares que frequento e, então, daí a importância de estar no Ilú Obá.

Estar com essas mulheres é muito fortalecedor, olhar para o lado e identificar histórias similares à minha, é sentir que não estou sozinha, inspirar outras mulheres e ter elas como inspiração é muito forte para mim.

Saber que tem alguém que se preocupa com os figurinos, se ele ficará bem no corpo gordo, é algo também muito incrível para mim.

Raspei meu cabelo ano passado, pois me inspirei em outras manas do bloco e me sinto muito liberta e muito à vontade depois disso.

Femenageamos a família Franco neste ano, conseguimos viajar para a Maré-RJ e realizar nosso primeiro ensaio 2024 naquele espaço. Foi emocionante! Tivemos a presença da família e, apesar de ter sido uma tarde muito chuvosa, levamos alegria. No cortejo de sexta-feira de carnaval, aqui em São Paulo, eles vieram e marcharam conosco! Deu para ver nitidamente a felicidade da família. Nossa intenção era levar para a rua o amor e a felicidade, e o nosso objetivo foi altamente alcançado. Nosso axé reverberou para a família Franco e para todas as outras que tiveram seus filhos brutalmente assassinados.

Este ano o enredo foi composto por 5 músicas que foram criadas pelas próprias mulheres do bloco. Com pegadas do maracatu até o funk, representando a cultura e o funk do RJ.

Frases como “Marielle somos nós” “Para saudarmos a vida, e a continuidade” “Marielle vive, presente” “Sementes plantadas, sementes florescidas, Marielle presente em nossas vidas” “Árvores frondosas, punhos fechados, é a mata de Oxóssi florida e negra” “Sou Antônio, Marinete, e as filhas da Filó, Anielle, Luyara nesta luta não estamos só” Foram algumas das frases que marcaram nosso carnaval.”

Logo, desta conversa como coletiva, continuamos afirmando o significativo e importância que é para as mulheres negras da periferia contarem com espaços seguros, de compromisso e afeto, onde possamos ser plenamente nós. A experiência do Ilú Obá de Min e a construção de Marielle são exemplos desta pauta. Continuamos semeando, continuamos florindo, resistindo e existindo.

“Sua história é de luta
Amar é revolução
Nas ondas da resistência
Feminismo Negra libertação
Negra é o seu sorriso
Arranha céu da identidade
Fankiando a alegria
Nosso batidão é a liberdade”

Composição coletiva Pernaltas do Orun

Imagem: @angelicaalvesfotografia e Eduardo Gomes Tattoo

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Escrito por Coletiva de Mulheres

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