O mercado de trabalho como uma forma de poder e controle social

Bora classe trabalhadora

Quero num dia desses de trabalho poder ficar sem pensar:
Será que hoje vai render?
Será que no final do mês vai dar para pagar?
Fico nesse emprego até o ano acabar?
São tantas inquietações e o pior!
Nem mesmo posso reclamar
Tem muitas outras que queriam estar onde consegui chegar.

Tem aquela sem emprego e tem ainda a que trabalha em lugar pior.
Umas sem renda alguma
Catando aqui e ali para não morrer como indigente por aí.
Outras que recebem o benefício
Que mesmo nem dando para se manter
O povo fala: aí vagabunda!!
Vai trabalhar mulher!
O governo não tem obrigação de te sustentar!

Engraçado que benefício de governo para pobre é assistencialismo, é esmola.
E para político é verba parlamentar.

O que eles recebem no mês de salário, paga o meu do ano todo
E ainda sobra para festejar.
Tem também a verba gabinete, auxílio moradia…
E é o auxílio gás que faz o Brasil afundar? 
O fim da verba paletó levou anos para consolidar,
Já do auxílio emergencial; foi bem mais fácil aprovar.

Quero um dia desses, sentar no transporte publico
E para o emprego rumar
Com a cachola se preocupando só com a paisagem para contemplar.
Sem cansar mesmo antes de lá chegar.

Não sei se é assim com você, mas eu não gosto do jeito que está.
É mulher ganhando menos.
Jovem sem saber se sua vez vai chegar
São idosos jogados no limbo
E o Brasil nessa balbúrdia de matar.

Sei que nada de presente nos foi dado.
Já dizia minha mãe e outras tantas como ela
Que para alguma coisa lá na frente mudar 
Precisamos nos mexer desde já.
Então bora.

É na escola. Nos conselhos de saúde.
Nos grupos de luta popular.
Vai se mexendo logo.
Se organiza.
Não para!
Se você não organiza a casa, vem outro dizendo arrumar.
Te joga na sarjeta 
E faz o povo acreditar que a culpa é tua.
Que a pobreza está contigo porque tens preguiça de trabalhar.

Zuca Fonseca

Entrando no mês de maio, as reflexões sobre a situação da classe trabalhadora, perdas de direitos, lutas coletivas ficam mais acentuadas e a Coletiva, nessa edição, vem passeando por dois caminhos com um breve olhar no mundo do trabalho: um deles é para o mercado de trabalho como uma forma de poder e controle e o outro é a reflexão sobre como o acúmulo de tarefas e ocupações estão refletindo nas demandas individuais e sociais.

Pensando no trabalho como forma de renda, podemos refletir um pouco sobre o pensamento de Jurema Werneck, que fala sobre o mercado de trabalho como uma das formas de controlar a renda e o acesso à riqueza da população e ainda como uma maneira de manter o privilégio branco, garantindo a esse grupo maior renda e riqueza.

A desigualdade de gênero no mercado de trabalho está dada. Mulheres tem menos oportunidades de promoções, recebem salários mais baixos, tem menos opções de escolhas quanto aos tipos de vaga de emprego, são expostas a períodos de desemprego mais prolongados, quando optam pela maternidade, ficando mais expostas ao emprego informal, como forma de geração de renda.

Fazendo o cruzamento com dados do IBGE, podemos constatar que mesmo com maior nível de escolarização, as mulheres permanecem em desvantagem com relação aos salários ofertados aos homens.

As pesquisas do Instituto mostram que nos dados levantados referentes ao ano de 2019 no Brasil, enquanto 54,5% das mulheres com idade acima de 15 anos de idade estavam inseridas no mercado de trabalho formal (aquele com carteira assinada), o número de homens na mesma faixa etária era de 73,7%. Todavia, quando avaliados fatores como a escolaridade, os estudos indicam que entre os homens com idade acima de 25 anos, 15,1% tem formação superior e com as mulheres na mesma faixa de idade, a porcentagem com curso superior era de 19,4%. Isso comprova que mesmo com mais estudo a desvantagem das mulheres é maior.

Voltando à reflexão de Jurema Werneck, ela aponta que a sociedade estruturada nos pilares do machismo e do racismo cria políticas e recursos que valorizam a remuneração do trabalho na seguinte escala: primeiro o homem branco, depois o homem negro, na sequência a mulher branca e no final da fila a mulher negra. Essa organização de prioridades não está pautada em qualidade ou quantidade de horas de trabalho, nem mesmo na escolarização das pessoas e sim nas escolhas de quem deve deter o poder sobre a sociedade.

Esse entendimento reforça a importância da participação da mulher nos campos políticos, institucionais ou não. Somente inserida nos processos e lutando para garantir seu direito à fala é que poderá pensar em leis e políticas públicas para reverter esse quadro.

A outra breve reflexão sobre o trabalho como forma de dominação está relacionada ao acúmulo de demandas em que a classe trabalhadora vem sendo submetida, impedindo-a de pensar em novas formas de organização e luta coletiva.

De modo geral, as trabalhadoras e trabalhadores estão envolvidas/os com uma série de atividades buscando a manutenção da vida, que não estão mais conseguindo garantir tempo para viver.

As pessoas que estão empregadas, seja qual for a forma de contratação, vêm trabalhando com sobrecarga, muita pressão dos empregadores e ausência de direitos que geram, além do desgaste físico, muito medo de perder o emprego e estafa emocional.

Em todos as categorias de emprego, cada vez mais é preciso cumprir metas mais elevadas deixando as pessoas inseguras, sem poder pensar em planejar seu futuro nem mesmo a curto prazo. Com a precarização do trabalho, o custo de vida elevadíssimo e a ausência de políticas públicas que mantenham a classe trabalhadora em segurança, se a população empregada se vê na necessidade de buscar outras formas de complementação de renda, o que esperar das condições de vida das pessoas que estão em subempregos ou desempregadas?

Todo esse processo de precarização e falta de empregos mina as relações das pessoas dentro e fora do ambiente de trabalho. Ao produzir uma classe trabalhadora com ausência de direitos e deficiência de recurso financeiro, diminuição de vaga no mercado de trabalho, ausência de políticas públicas para geração de renda e manutenção da vida, os níveis de desconfiança entre as pessoas aumentam, impossibilitando a construção de relações sociais que permitam o interesse em trabalhar coletivamente. Como conseguir cuidar do social quando as pessoas não estão conseguindo cuidar nem mesmo do seu núcleo familiar ou de si?

Para conseguir mudar esse quadro é justamente nesse momento que precisamos reorganizar os coletivos. Com uma sociedade adoecida física e psicologicamente, sem renda, sem emprego e sem comida na mesa, é preciso rediscutir as formas de organização grupal.

Em todos os espaços de organização popular é preciso discutir numa linguagem acessível a todos que só vamos conseguir nos reerguer e resolver os nossos problemas se criarmos alternativas coletivas.

Atividades como aulas públicas, rodas de conversa, saraus, lives vão permitindo que mais pessoas comecem a pensar sobre os problemas. Cada uma dessas ações são formas de resistências para manter a nossa existência.

Imagem: Juarez José

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Escrito por Coletiva de Mulheres

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