Transitar pelas calçadas de São Paulo é um risco constante que provoca acidentes com mortes e sequelas

Transitar pelas calçadas de São Paulo é um risco constante que provoca acidentes com morte e sequelas. 

A expansão das cidades no Brasil seguiu a lógica de reservar à população, sobretudo para a classe trabalhadora, a responsabilidade total com a moradia numa onda em que a industrialização acelerada provocou, em curto espaço de tempo, a vinda de milhões de pessoas para os grandes centros.

Essa dinâmica acarretou um verdadeiro inchaço das cidades, submetidas a um crescimento acelerado e praticamente com baixíssimo investimento do poder público que, atuando deliberadamente ou em função da especulação imobiliária, foi negligente para garantir moradia à crescente população e, também, regrar a ocupação do espaço urbano.

A desorganização passou a ser um projeto para as periferias que se viram abandonadas, sem equipamentos públicos, em amontoados de moradias, fruto de permanente autoconstrução em comunidades e bairros “clandestinos” que tornaram-se uma das principais alternativas para a classe trabalhadora.

Neste processo de ocupação desordenada, o espaço de circulação, principalmente aquele que deveria ser reservado ao pedestre, foi, gradativamente, sendo comprometido; as calçadas foram sacrificadas numa cidade onde os bairros periféricos estão em áreas que precisariam da intervenção do poder público para, no mínimo, orientar e ordenar os limites para ocupação.

Temos, portanto, uma dinâmica hostil ao pedestre, que fica refém entre o público e o privado. As calçadas não foram preservadas e, em grande parte, estão adequadas para facilitar o acesso do automóvel às moradias, mesmo nos bairros periféricos.

Não obstante essa realidade, existe todo um ordenamento legal que regra a ocupação dos espaços públicos e que contempla um conjunto de normativas para possibilitar a locomoção de pedestres.

O que é uma calçada

A calçada é composta, ou teria que ser, um passeio que, além de possibilitar a circulação de pedestres deve, em tese, comportar a infraestrutura necessária com equipamentos públicos diversos: paradas de ônibus, postes, árvores, ajardinamentos, painéis informativos, semáforos, entre outros itens para garantir a segurança, informação e trânsito no espaço urbano.

O espaço mínimo de passeio para o pedestre, contemplando cadeirantes e pessoas que fazem uso de muletas, deve ser no mínimo, 1,20 m livre. Todavia, temos calçadas com 30cm ou mesmo, nenhuma calçada ou, ainda, com obstáculos que superam um metro de altitude. Soma-se a esse drama, a falta de rampas de acesso, tornando muito arriscado o deslocamento de pedestre.

Aqui na região, temos um ocorrido recente em que um cadeirante caiu no chão ao descer da calçada. Situação como essa poderia ser evitada se houvesse rampas para facilitar todo tipo de embarque/desembarque.

Os pontos de ônibus deveriam, no mínimo, possuir 15 metros livres para acomodação do coletivo e, assim, evitar o posicionamento do veículo longe da calçada.

Vale lembrar que a calçada, em que pese ser parte da via, não é espaço de circulação de veículos. Os passeios constituem parte da calçada que, por sua vez, pode ser parte da pista de rolamento devidamente sinalizada por pinturas ou elementos de marcador físico, para possibilitar a circulação exclusiva de pedestre.

Neste sentido, a calçada está na via e o passeio está na calçada. Lembrando que a via contempla, também, o acostamento e canteiro central para trânsito de pessoas, veículos e animais.

Quanto ao passeio, deve permanecer livre de interferência para facilitar o trânsito de pedestres e, em casos excepcionais, devidamente sinalizada para ciclistas.

Educação cidadã

Faixas pintadas sobre a pista de rolamento são permitidas, em que pese a prioridade para trânsito de veículos. Quando se opera esta adequação, a educação dos usuários deve ser trabalhada para consolidar a cultura de respeito, na medida em que as faixas passem a ser usadas como passeio.

Infelizmente, a cultura em relação a espaços que sofrem sinalização horizontal, particularmente na cidade de São Paulo, é pouco respeitada.

“Minha calçada”

Existe uma “lenda urbana” que considera a calçada defronte das residências como extensão do próprio terreno, percepção igualmente comum também nas comunidades. Tal confusão provoca verdadeiras barbaridades onde o “dono” da calçada a adequa de acordo com seu interesse, erguendo, inclusive construções!

Neste sentido, todo e qualquer “puxadinho” ou degrau para facilitar o acesso de veículos ou qualquer obstáculo que iniba ou dificulte aos transeuntes está em desacordo com a lei. Por outro lado, é de responsabilidade do proprietário/ocupante do imóvel garantir a livre circulação e conservação das calçadas sob risco de ser penalizado.

Promover políticas públicas, fiscalizar e investir na adequação das calçadas é obrigação do poder público, sobretudo numa cidade como São Paulo, onde o envelhecimento da população é realidade também na periferia.

Garantir e preservar os espaços de uso coletivo é importante como componente maior na dinâmica de prevenção, atitude que pode evitar milhares de acidentes que ocorrem motivados por inadequação das calçadas e poderia reduzir significativamente o risco de quedas e acidentes.

Imagem: Bruno O.

Compartilhe:

Deixe um comentário