Poesias escritas por Alexandre Sizoski (Bolacha).

Dar tempo ao tempo

Dar tempo ao tempo,
os dias irão se despir diante de mim,
entenderei o porquê de minhas lágrimas,
as verdades se ajoelharam diante de mim,
tudo fará sentindo,
todas elas tiveram seu papel,
todas tiveram sua importância,
neste constante aprendizado,
para eu ser melhor para a próxima.

Dar tempo ao tempo,
sem voltas,
sem entender,
aumentando minhas compreensões,
sobre o diário,
sobre as relações,
diminuindo minhas expectativas,
congelando o meu eu,
ensinando-me o que é o amor.

Dar tempo ao tempo,
para o amor se mostrar,
inevitável,
tendendo ao infinito,
que transcende o além,
que quando puro,
mostra sua força,
requerendo uma batalha cotidiana,
forçando-nos a nos traduzir para a pessoa amada e decodificá-la por inteiro,
sem medos,
sem segredos,
sem pudores,
sem garantias,
fazendo-a feliz para obter nossa felicidade.

Dar tempo ao tempo,
sabendo que o sentimento morrerá lentamente,
intoxicado pelos egos,
por não entender sua transformação,
por não dar o valor devido,
limitando-o ao pouco,
tendendo a zero,
produzindo o sofrimento,
envolvido pelo silêncio
e o choro engasgado na garganta,
tendo uma solitária lágrima traiçoeira
que corre em nossa face sem permissão.

Meus irmãos

Navio negreiro?
O navio negreiro agora passa sob e sobre a terra,
compactando sonhos, esperanças, histórias de superações diárias,
levando o povo:
Brancos, negros, nordestinos, não importa todos pobres
pobre gado…
Gado adestrado…
Assalariados que saem da periferia, onde a cores das moradias são marrom cerâmica,
para o canavial contemporâneo de cor cinza concreto.
Pobre povo, moldado por padres, pastores, mídias e outros formadores de opiniões.
Opinião não!
Pensamentos condicionados e formatados dentro dos padrões pré-definidos,
povo que age de forma correta,
talvez seja…
Ou talvez somente a sensação do dever cumprido que segundo o condicionamento
deverá saciá-lo e enchê-lo de orgulho.
E o capitão-do-mato?
O capitão-do-mato de uniforme e bem armado
quando chega à periferia, pobre periferia, periferia pobre,
desrespeitando,
humilhando,
se equivocando,
pois o poder de uma farda, que lhe dá o direito de julgar, condenar e executar.
Julgar, condenar e executar pobres negros, nordestinos, brancos pobres,
Estranho!
Estranho, pois dentro das fardas há:
Negros também,
nordestinos também,
brancos pobres também,
estranho…
A carta de alforria foi assinada, mas o capitão-do-mato nunca nos abandonou,
“E está sempre certo e dentro da lei.”
Só que não…
Lei?
Lei que vigora em qualquer época,
existem para proteger interesses com aval dos políticos, religiosos e da “sociedade”
e quando aqui a liberdade faltava a os irmãos negros
e matar os índios, os verdadeiros donos das terras, era uma rotina,
ela, a lei, também impunha sua força através do direito.
Direito dos senhores-de-engenho,
direito das igrejas,
direito da “sociedade”
direito dos políticos.
Não pretendo entender os políticos,
pois eram manipuladores sem escrúpulos
e faziam parte da elite da sociedade, os que oprimiam.
Nada mudou…
E os religiosos?
Os religiosos, eu nunca os entendi,
como podiam aprovar atrocidades:
A venda de um ser humano,
o estupro para multiplicação de mão de obra,
o assassinato,
açoite até a morte,
o filho separado da mãe,
a fome,
a tortura,
não foi isso que foi pregado pelo Mestre Jesus,
não era isso que estava escrito nos livros sagrados
tantas orações em vão…
E o feijão?
E o feijão preto que os negros comiam?
Comiam com restos de porcos que para a sinhazinha de nada servia,
mas que com o carinho da Mãe Preta se transformava em uma suculenta feijoada.
Hoje prato típico do país, mas que esconde em seu sabor:
O sabor amargo da fome,
o sabor amargo das humilhações,
o sabor amargo do trabalho forçado,
o sabor amargo do porão,
o sabor amargo das torturas,
fome também é tortura…
E os filhos negros da pátria?
Por que os perseguiram?
Por que os perseguem?
Primeiro nos terreiros, nas senzalas,
agora nos morros, nas periferias,
quem se importa?
Com aflição da mãe cujo filho é negro,
filhos negros, filhos brancos pobres, filhos nordestinos,
quem se importa com eles?
Quem os entende?
Quem chora por eles?
Quem os sepulta?
Quem se importa com as lagrimas da mãe?
Generalizar é mais fácil…
E os sons negros?
Sons negros que vieram conosco da terra mãe,
são nossos sons que nos representam,
cultura imposta nunca nos representará.
E nossos Deuses?
Deuses que vieram conosco da terra mãe,
religião imposta nunca nos representará,
Só existe uma rainha do mar
Só existe uma…
Viva Iemanjá!
A resistência que existia dentro do coração do povo negro,
às vezes custando suas vidas,
mas aguçando o desejo da liberdade,
aguçando o desejo do justo,
transformou toda injustiça em arte, capoeira, danças, ritmos
e gerou grandes mentes negras que fazem questão de transformá-los em mentes
invisíveis.
Existiram quilombos, centro de resistência, união e multiplicação de conhecimentos.
Existem quilombos, Centro de Cultura Negras, Terreiros, Escolas de Samba, união e
multiplicação de conhecimentos.
Gratidão aos que passaram por aqui e lutaram por nós,
Gratidão aos que estão por aqui lutando por nós,
Gratidão aos que ainda virão e, se os Orixás abençoarem, não precisarão mais lutar…

Imagens: Bruno O.

Gravação em áudio: Paloma Souza

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Escrito por Expresso Periférico

2 thoughts on “Dar tempo ao tempo e Meus irmãos”
  1. Excelentes reflexões e ponto de vista, registrado por Alexandre. Na segunda parte nos faz indagar a pergunta que o poeta legionário nos fez, tão atual quanto nunca: “QUE PAÍS É ESSE”?🤔

    “Poeta, não é somente o que escreve. É aquele que sente a poesia, se extasia sensível ao achado de uma rima à autenticidade de um verso.”
    ― Cora Coralina

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