Por Marcos Manoel dos Santos*

Há 1 ano a sociedade brasileira estava em pânico e apreensiva por conta dos ataques e ameaças de ataques às escolas. Dois fatos explicavam aquele clima: a morte da professora Elizabeth Tenreiro na Escola Estadual Thomazia Montoro na região do Butantã e a ameaça de uma série de ataques que estavam sendo preparados para ocorrer no dia 20 de abril, por ocasião do aniversário dos ataques em Columbine, nos EUA, em 1999.

De lá para cá, algumas coisas mudaram. Outras continuaram como antes e aprendemos muitas outras. O Governo Federal, por meio dos Ministérios da Justiça, da Educação, da Polícia Federal e outros órgãos, realizou investigações, prendeu pessoas, desmantelou redes virtuais e evitou ataques. Além disso, um grupo de trabalho de especialistas em violência nas e contra as escolas foi montado e divulgou um relatório chamado “Ataque às escolas no Brasil: análise do fenômeno e recomendações para a ação governamental”. No âmbito municipal, mesmo com a promessa de ações como contratação de “Mães POT segurança”, instalação de botão de pânico, pouco se viu. As escolas municipais continuam sofrendo com a falta de profissionais para diversas tarefas, inclusive a proteção escolar. O botão do pânico é um ilustre desconhecido, assim como o protocolo em caso de ocorrência de ataques contra as escolas. Por sua vez, na esfera estadual, a promessa da chegada de psicólogos às escolas foi parcialmente atendida e o programa CONVIVA, que existia antes dos ataques e episódios de abril de 2023, foi enfraquecido como tantas outras políticas voltadas para a educação e os direitos humanos na atual administração estadual. Não há registro de estudo semelhante ao realizado pelo Governo Federal para a realidade das escolas da cidade ou do estado de São Paulo.

Enquanto isso, nas escolas, foi preciso muita solidariedade, clareza quanto aos Projetos Políticos Pedagógicos, coragem e diálogo com as famílias e comunidades para evitar retrocessos como a construção e elevação de muros, instalação de cercas, ampliação dos sistemas de câmeras em todos os espaços, inclusive salas de aula, o afastamento da comunidade e a presença de policiais dentro das escolas.

Em nossa região, por iniciativa de educadores e educadoras da rede municipal, foi constituído um Comitê de Proteção Escolar que, junto com a Diretoria Regional de Educação de Santo Amaro, tem refletido sobre o tema, realizado ações formativas e procurado manter ativo esse espaço de referência sobre o tema em nossa região.

Ao longo desse 1 ano que se passou, ocorreram ataques, ainda que pareçam não ter tido as mesmas motivações de abril de 2023. No entanto, a preocupação continua. Em diversas regiões da cidade, inclusive na nossa zona sul, ataques foram evitados, seja pela ação investigativa da segurança pública ou principalmente pela perspicácia de educadores e educadoras no chão das escolas.

Nesse ínterim de 1 ano, um episódio chocou nossa região. Uma escola, na região do Jabaquara, foi invadida por policiais militares, estudantes e adolescentes foram agredidos e o espaço escolar foi violado. Essa situação revelou a ausência de um protocolo de acesso das forças de segurança pública às escolas e a urgência de que o mesmo seja elaborado para que cenas como aquelas não se repitam.

No relatório apresentado pelo grupo de trabalho do governo federal, há destaque especial para a importância de se combater os discursos de ódio e notícias falsas na internet e a urgente necessidade de formação para crianças, estudantes, educadores e familiares na perspectiva de uma educação midiática para que consigam usufruir melhor da cultura digital, dos conhecimentos e benefícios advindos das plataformas e redes sociais. Além disso, há especial preocupação com a cultura gamer, uma vez que os jogos online têm se mostrado espaço de formulação e difusão de discursos e práticas de ódio, intolerância e outros ataques à dignidade humana.

Os estudos realizados até aqui mostram que não devemos esquecer o que aconteceu, que precisamos continuar fortalecendo os vínculos entre escolas e comunidades, fortalecendo a convivência, realizando projetos significativos em parceria com a cultura, esporte, meio ambiente, apoiando estudantes e educadores em suas questões de saúde emocional, fortalecendo a rede de proteção social, combatendo todas as formas de preconceito e violência, bullying, homofobia, machismo, misoginia, etc, dentro e fora da escola. Os ataques, assim como a pandemia do COVID-19, revelaram a importância e fragilidade das escolas e também a urgente necessidade de toda a sociedade se somar aos educadores e educadoras na defesa da escola pública

Outra lição importante é que a violência contra a escola é parte e resultado da violência geral e generalizada em nossa sociedade, assim como do discurso de ódio e extremismo protagonizado pela extrema direita nos últimos anos em nosso país. Nesse sentido, para acabar com a violência contra as escolas é preciso não perder do horizonte a utopia de viver numa sociedade pacífica, democrática, justa e igualitária socialmente, uma sociedade socialista. 

Não tenhamos ilusões, as escolas sozinhas não construirão essa sociedade. Porém, devem atuar como espaços promotores da cultura de paz, da escuta, do diálogo, da formação e fortalecimento das redes de proteção nos territórios. Devem contribuir com o fortalecimento da autoestima e dignidade de todas as pessoas, a começar por crianças, adolescentes e jovens. Na escola segura e promotora da segurança, todas e todos devem ter ação e formação contínua para defender, promover e ampliar os direitos humanos. Esperamos daqui 1 ano celebrar as conquistas nesse sentido.

* Marcos Manoel dos Santos é diretor de escola na EMEI Cruz e Sousa. Graduado em História e Pedagogia. Especialista em Gestão de Políticas Públicas. Filiado ao PT e atua em coletivos de educadores na perspectiva de construção de políticas intersetoriais nos territórios.

Imagem: Bruno O.

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Escrito por Expresso Periférico

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