Ao focarmos nessas candidaturas, é essencial abordar a interseccionalidade e o papel de resistência que cada uma dessas mulheres desempenha

Nos últimos tempos, não tem sido raro pensar em política como trampolim. E isso vem afastando as pessoas das reflexões sobre a importância da nossa participação, nosso envolvimento na política em nossa cidade, nosso estado, no país e no mundo.

É muito comum que a população se afaste dos coletivos de estudo, articulação e ações voltadas para a formação e engajamento, naturalizando a desigualdade, ausência de políticas afirmativas e participação popular, responsabilizando as pessoas em situação de vulnerabilidade pelas mazelas pelas quais vêm passando.

Em ano eleitoral, ouvimos falar sobre planos de governo, propostas de políticas públicas para as minorias, ênfase na participação das mulheres nos partidos, de negras e negros, da população LGBTQ+, dos povos originários, dos periféricos… Há espaço para a participação de todas as pessoas dentro dos partidos.

E por que é assim? Resolve a participação bianual? Sabemos que não.

Toda e qualquer transformação se da através de processos e na participação política não é diferente. A nossa atuação é diária e a formação permanente, todavia, é preciso compreender que políticas públicas são construídas dentro das instâncias públicas da política e por isso precisamos das representatividades dentro dos poderes.

Novamente nos deparamos com um período eleitoral, acompanhado de uma avalanche de papéis e discursos que emergem a cada ciclo. Mas, será que, amanhã, esses discursos ainda refletirão as verdadeiras preocupações do território que habitamos? O cenário atual revela um aumento na presença de mulheres candidatas, incluindo mulheres negras e do coletivo LBT+, o que nos leva a questionar: quem são essas mulheres? O que representam e a quais interesses respondem? Suas características por si só não garantem uma boa gestão ou um olhar alinhado com o feminismo que enfrenta a extrema direita.

Atualmente a Câmara Municipal de São Paulo é composta por 55 vereadores e, mesmo com os avanços nas eleições de 2021 nas pautas identitárias com a eleição de 2 transexuais, 2 mandatos coletivos e o aumento de mulheres negras assumindo as cadeiras, é visível a desigualdade que reflete nas políticas públicas que não atendem as demandas das diversidades dentro de todos os setores como educação, saúde, saúde mental, alimentação, emprego e renda e muito mais.

No panorama geral, o que temos na Câmara dos Vereadores, é um quadro com 55 cadeiras sendo que dessas apenas 13 são ocupadas por mulheres e somente 4 dessas são vereadoras do campo progressista, ou seja, de partidos de esquerda. É importante pensar nesses números e como ele é composto?

Muito importante, porque sabemos que vereadoras da direita e extrema-direita não defendem pautas pensadas na igualdade de direitos e defesa dos direitos humanos. A atuação delas fortalece a estrutura do patriarcado.

Para as eleições 2024, tivemos mais de 1000 candidaturas lançadas entre os diversos partidos e apenas a porcentagem obrigatória de candidaturas femininas. 

Compreendendo que vereadoras e vereadores têm um papel fundamental na criação de políticas públicas, somente com representatividade podemos pensar em pequenas mudanças, que não vão ainda abalar as estruturas, pois o sistema político do capitalismo, por si só, não tem base para mudanças radicais.

Ao focarmos nessas candidaturas, é essencial abordar a interseccionalidade e o papel de resistência que cada uma dessas mulheres desempenha. A interseccionalidade é uma ferramenta crucial na escolha de vereadoras, pois permite perceber as especificidades dos grupos afetados simultaneamente por diferentes formas de desigualdade. Isso possibilita a criação de medidas direcionadas a romper barreiras que seriam invisíveis se vistas isoladamente. Na prática, traduz-se na formulação de políticas públicas que reconhecem e enfrentam as múltiplas camadas de opressão, proporcionando um atendimento mais justo e eficaz às necessidades dos cidadãos. Um exemplo desta interseccionalidade são as vereadoras que lutam para garantir o reconhecimento e respeito na Câmara de Vereadores, como por exemplo Luana Alves, uma mulher negra que trava a sua batalha para responsabilizar o vereador Camilo Cristófaro por racismo e que reflete a força e a resiliência do movimento negro.

Outro aspecto relevante é examinar as alianças que essas mulheres construíram, sua origem e as lutas que enfrentaram. Temos exemplos inspiradores de mulheres ativamente envolvidas na política, que não chegaram lá por acaso. Elas carregam um histórico de lutas por direitos e representatividade, um caminho repleto de resistência e conquistas. Essas mulheres são portadoras da força de suas comunidades e da herança ancestral que as fortalece. Entre elas, podemos olhar o exemplo de Margareth Menezes, cuja contribuição à diversidade cultural da Bahia enriquece o atual Ministério da Cultura, e Sônia Guajajara, que, após uma longa trajetória de defesa dos direitos dos povos indígenas, agora lidera o Ministério dos Povos Indígenas.

Este panorama atual ecoa a luta histórica das feministas do passado e continua afirmando que o feminismo é um espaço de resistência, já que com o crescimento de governos e movimentos de extrema-direita na região, são os coletivos de mulheres organizadas que tem desempenhado um papel crucial na resistência a políticas regressivas e na luta pelos direitos de todos, todas e todes.

O presente e o futuro das mulheres na política devem ser compreendidos à luz de suas trajetórias e batalhas ao longo do caminho. As vitórias atuais são frutos do esforço contínuo de muitas que vieram antes e abriram caminho para um espaço político mais justo e representativo. Na escolha das próximas eleições, temos que pensar em pessoas que continuem fortalecendo redes de apoio para o enfrentamento das forças da extrema-direita que continua como uma latente ameaça não somente no Brasil como na região. Pessoas que continuem em contato com as bases para enfrentar novos desafios e continuar a promover os direitos das mulheres e das populações mais vulnerabilizadas.

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Imagem: Montagem com foto de André Bueno/CMSP e imagem de Freepik

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Escrito por Coletiva de Mulheres

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