Crônica escrita por Vicente Ruiz
“Moro num país tropical, abençoado por Deus e bonito por natureza (mas que beleza!)”. Esta canção de Jorge Ben Jor era praticamente um hino cantado por todo brasileiro na década de setenta. Tudo sorria para as pessoas alienadas: campeões do mundo no futebol. “Brasil, ame-o ou deixe-o” era o slogan da ditadura. “Eu te amo meu Brasil eu te amo, meu coração é verde amarelo azul…” Todos cantavam.
O Cristo Redentor cuidava do Rio de Janeiro (do Brasil) desde o alto do morro…
Essa euforia que a ignorância proporcionava, permitiu aos torturadores mostrar a cara mais vil do ser, chamado erroneamente de humano.
Acreditamos, durante muitos anos, que Deus abençoava o Brasil. Nos sentíamos o filho predileto dele. Nos parecia tão natural! Brasileiro é tão alegre, simpático, acolhedor! O Brasil era um jardim natural!
O começo do século XXI nos sorria. O Brasil era admirado no mundo inteiro.
Éramos crianças mimadas por um pai que nos comprava montes de brinquedos antes de pedi-los.
Aprendemos a acumular, não a repartir. Ficamos com medo de outras crianças pobres conseguirem comprar brinquedos e não ter mais para nós.
Gritamos. Choramos. Ganhamos um padrasto que acabou até com as fábricas de brinquedos e afundou o Brasil. Semeou o ódio, a violência, a morte pelas cidades e fora de casa. Vendeu o nosso país, em liquidação, para os gringos: pré-sal, Vale do Rio Doce, privatizações…
Voltamos a ser vira-latas, a ter vergonha de ser brasileiros. Jogamos fora a bacia com a criança que tomava banho.
“Como vai o Brasil? Tudo bom?”
“Tudo bom”, respondemos automaticamente. Mas nosso pensamento nos corrige. “Não! Está muito ruim e tudo pode piorar, senão gritarmos e lutarmos.”
Hoje, Sexta-Feira Santa, o Brasil repetirá com Cristo a quarta palavra por ele proferida na cruz: “Meu Deus, meu Deus por que nos abandonas-te?”
Imagem: Bruno O.
Gravação em audio: Evinha Eugênia